A fase de grupos da Copa Libertadores se encerra nesta quinta-feira (27), mas já há um fato consumado e inalterável: seis brasileiros e seis argentinos ocupam 12 das 16 vagas nas oitavas de final do torneio. O fato não é inédito, já que aconteceu também em 2018, mas é o retrato perfeito da desproporcional polarização do futebol dos dois países sobre o continente. Enquanto em 2021 75% do mata-mata será composto por Brasil e Argentina, no início do século, em 2001, o percentual correspondia a 43,7%.
Lá em 2001, quatro brasileiros (Cruzeiro, Palmeiras, São Caetano e Vasco) e três argentinos (Boca, River e Rosário Central) chegaram nas oitavas de final, após passarem pela fase de grupos. Este não é o pior registro de Brasil e Argentina no século, que em 2002 viu os uruguaios serem maioria na primeira fase eliminatória. Daí, então, vem a pergunta: o que aconteceu?
A verdade é que a resposta para a questão não pode ser respondida por apenas um fator. Existe, pelo menos, quatro grandes motivos para o domínio de Brasil e Argentina.
Sem dúvidas, este é o ponto mais lembrado e que gera maior polêmica pela América do Sul. A partir de 2017, com a saída dos clubes mexicanos da Copa Libertadores, mais vagas foram distribuídas para Brasil (duas), Argentina, Chile e Colômbia (uma cada).
Com, pelo menos, sete integrantes na Libertadores desde 2017, o Brasil passou a classificar sempre para as oitavas de final seis equipes: foi assim em 2017, 2018, 2019, 2020 e, agora, em 2021. Ao olhar para o século XXI como um todo, apenas em 2013 seis clubes brasileiros haviam passado de fase também. O pior cenário registrado pelo país foi em 2002, quando dois brasileiros chegaram nas oitavas de final (São Caetano e Grêmio). Naquele ano o campeão foi o Olimpia, do Paraguai.
O ano de 2002 é um bom modelo para ser utilizado como exemplo. Naquela edição, clubes de nove países passaram pela fase de grupos e quem dominou a primeira fase foram os uruguaios. Agora, em 2021, o auge da polarização Brasil-Argentina, assim como em 2018, apenas cinco países avançaram para o mata-mata.
Sabe aquele "domínio" uruguaio de 2002? Pois é, nunca mais aconteceu. O país, que tem oito títulos de Copa Libertadores, passa cada vez mais por maus bocados na competição.
Depois de classificar três equipes em 2002 para as oitavas, o máximo que o Uruguai conseguiu desde então foi levar dois clubes para a fase eliminatória. O pior nem é esse registro, uma vez que é sabido o amplo domínio que Nacional e Peñarol possuem no país. O que mais assusta é que apenas duas vezes, em 19 anos, dois times uruguaios avançaram para as oitavas de final. Fora este fato, em quatro oportunidades nenhuma equipe uruguaia passou da fase de grupos.
No século XXI, 336 vagas para as oitavas de final estiveram em disputa e somente 21 delas (6,2%) ficaram com clubes do Uruguai.
Outro país que decaiu de forma impressionante é a Colômbia. No intervalo entre 2001 e 2008 o país foi a terceira principal força do continente, levando 16 equipes para as oitavas de final nesse período. De 2009 para frente, apenas em 10 oportunidades os colombianos se garantiram na fase eliminatória. Nos últimos cinco anos, só uma vez um clube colombiano chegou nas oitavas de final.
A já citada saída dos clubes mexicanos na Libertadores é um ponto-chave para a história recente do torneio. A explicação é simples: o país, ainda que nunca tenha vencido o torneio, era o terceiro a mais vezes se classificar para o mata-mata: Brasil (101), Argentina (75), México (30), Paraguai (27), Colômbia (26), Equador (24), Uruguai (21), Chile (15), Bolívia (7), Peru (6) e Venezuela (4).
Se a vantagem do México não surpreende tanto, é importante lembrar que o número acumulado de todos os clubes é entre 2001 e 2021. No caso do México, são cinco anos a menos na conta, de 2001 a 2016. Ou seja, mesmo há cinco anos sem disputar a Libertadores, o país ainda detém o posto de terceiro lugar nessa conta.
É inegável que, ao longo das últimas duas décadas, os clubes brasileiros e argentinos fortaleceram-se muito no continente, pelo menos em comparação com os clubes adversários.
Independente do número de vagas ter crescido para os países, o que cresceu também foi o poderio financeiro e a soberania sobre os rivais. Lembra-se que Chile e Colômbia também ganharam mais vagas a partir de 2016? O efeito foi nulo para ambos países, que tiveram no último intervalo de cinco anos (2016-2021) o pior desempenho no século.
Evolução das vagas por país*:
2001 - 2006: Brasil (23), Argentina (18), Colômbia (13), México (12), Equador (8), Uruguai (7), Paraguai (6), Chile (6), Peru (2), Venezuela (1) e Bolívia (0);
2007 - 2011: Brasil (25), Argentina (14), México (11), Uruguai (7), Colômbia (6), Paraguai (5), Chile (4), Equador (3), Peru (3), Venezuela (2) e Bolívia (0);
2012 - 2016: Brasil (23), Argentina (20), México (7), Colômbia (6), Paraguai (6), Equador (5), Uruguai (4), Bolívia (4), Chile (3), Peru (1) e Venezuela (1);
2017 - 2021: Brasil (30), Argentina (23), Paraguai (10), Equador (8), Uruguai (3), Bolívia (3), Chile (2), Colômbia (1), Peru (0) e Venezuela (0).
Percentual de vagas conquitadas nas oitavas de final no século:
*Destacado em negrito o melhor desempenho dos países por intervalo de 5 anos. Note-se que o primeiro intervalo possui, excepcionalmente, seis anos.