Disputa de pênaltis. Última cobrança. Final de campeonato. Pia corre, chuta e marca. Suécia campeã da primeira Eurocopa feminina.
Quem acha que Pia Sundhage alcançou a fama e as conquistas apenas como técnica de futebol está enganado. Apesar de ser muito vitoriosa como treinadora, a sueca também foi bem sucedida na sua época de jogadora, conquistando títulos e colecionando feitos.
Pia Sundhage nasceu em 13 de fevereiro de 1960, na Suécia. A jovem menina que tinha o sonho de fazer do futebol sua profissão teve que enfrentar a quase inexistência do esporte em uma época em que a informação era escassa e a mentalidade retrógrada.
“Quando era criança, eu realmente achava que era a única garota no mundo que gostava de jogar futebol. Eu sonhava em me tornar uma jogadora profissional, mesmo que o futebol feminino ainda não existisse”, disse em vídeo para a Fifa.
Pia contou que, quando ainda estava na escola, precisou fingir ser um menino para conseguir jogar futebol com uma estrutura melhor. O nome que ela adotou é…sugestivo.
“Eu consegui participar de alguns times juvenis para meninos por causa de um treinador, Kent Olof. Ele me perguntou: ‘Você quer jogar futebol de verdade, com árbitros, trave e rede?’ ‘Sim, eu quero.’ ‘Então vamos enganá-los um pouco. No lugar de Pia, nós vamos te chamar de Pelle.’ Então eu fui chamada de Pelle por dois anos e joguei no time de meninos do Marbäcks IF. Eu fiquei muito feliz”, completou no vídeo.
Em outra entrevista, Pia revelou que, anos depois, passou a entender o peso de um apelido tão próximo ao de Pelé, o jovem garoto que conquistou a Copa do Mundo em 1958 na própria Suécia, e, na altura, já havia se consagrado como Rei do futebol. Sundhage contou que, junto ao eterno camisa 10 da seleção brasileira, seus outros ídolos de infância e juventude eram Franz Beckenbauer e Johan Cruyff.
Pia já atraía atenção muito nova. Ela foi convocada para a seleção sueca pela primeira vez aos 15 anos após se destacar jogando pelo Falköpings KIK, ainda em 1975, antes mesmo de jogar, de fato, profissionalmente.
“Foi em 1975 contra a Inglaterra, em Gotemburgo, e nós ganhamos por 2 a 0. O técnico da seleção me ligou e eu também li num jornal. Obviamente foi uma grande coisa para mim aos 15 anos. Mas eu não fiquei nervosa. Eu era habilidosa… até mais que algumas outras. Isso me fez ficar confortável com o grupo”, disse a sueca.
A carreira por clubes de Pia Sundhage começou no próprio Falköpings KIK, mas logo a jogadora se transferiu para o Jitex BK, onde teve algumas passagens ao longo dos anos. Foi lá que Pia conquistou seus quatro títulos do campeonato sueco feminino (1979, 1981, 1984 e 1989) e duas Copas da Suécia (1981 e 1984).
Pia saiu do Jitex BK, pela primeira vez, em 1982 para jogar no Osters IF, onde permaneceu até o ano seguinte. Nessas duas temporadas, Pia fez 30 e 35 gols, respectivamente. Goleadora! Atacante ou meio-campista, a sueca teve um único ano fora de seu país natal. Em 1985, ela atuou com a camisa da Lazio (e marcou 17 gols), mas logo voltou para o campeonato sueco.
Por clubes, Pia ainda teve rápida passagem no Stattena IF e brilhou pelo Hammarby, onde teve rápida passagem também em 1985, mas chegou para ficar de vez no clube em 1990. Lá, ganhou mais duas Copas da Suécia (1994 e 1995) e se aposentou do futebol profissional em 1996.
A carreira de Pia, por clubes, já pode ser considerada muito boa. Porém, o grande trunfo da sueca é sua trajetória pela seleção.
Pioneira na Euro, em Copas e no Wembley
Apesar de ter estreado muito nova, conseguiu o maior feito aos 24, em 1984. No dia 27 de maio, Sundhage e suas companheiras conquistaram a primeira Eurocopa feminina na Inglaterra, contra as donas da casa. Em um formato diferente do atual, as suecas venceram o primeiro jogo em casa por 1 a 0, gol de Pia, e perderam pelo mesmo placar na volta.
Como citado no início do texto, o pênalti do título foi cobrado por Pia Sundhage, em Luton, para pouco menos de três mil pessoas no estádio Kenilworth Road. Em entrevista para a Uefa, a sueca falou sobre como foi a decisão para a última penalidade.
“No dia anterior ao jogo de volta, nosso técnico, Ulf Lyfors, perguntou quem cobraria o último pênalti, se necessário. Eu estava confiante que não seria necessário e me voluntariei. Ele olhou e disse ‘Agora você prometeu’ “, contou Pia, que terminou a competição como artilheira, melhor jogadora e campeã daquela edição.
Em 1987, jogando no meio-campo, a sueca chegou em outra final de Eurocopa contra a Noruega, o país-sede. Porém, naquela oportunidade, foram vice-campeãs ao perder por 2 a 1 na final.
Na edição seguinte, em 1989, Pia Sundhage e suas companheiras perderam novamente para a Noruega, agora, nas semifinais. Porém, as suecas não se abalaram e, com um gol de Pia, venceram a Itália por 2 a 1 para conquistar o terceiro lugar da competição.
Também em 1989, Pia marcou um gol histórico para o futebol feminino. Foi ela a primeira mulher a marcar um gol em Wembley. Isso aconteceu em uma vitória das suecas sobre a Inglaterra por 2 a 0.
Para o site da Fifa, Pia falou sobre ter participado da primeira edição de uma competição histórica, a Copa do Mundo feminina, em 1991, na China.
“Quando anunciaram (a primeira Copa do Mundo feminina) nós dissemos: ‘Já era hora!’ Eu já tinha 31 anos e jogava desde os meus 15 anos sonhando com uma competição entre as melhores seleções do mundo. Para mim foi um marco, um reconhecimento (ao futebol feminino). Foi muito empolgante”, disse.
Durante o torneio, a Suécia chegou a jogar contra o Brasil e venceu por 2 a 0 com um gol de Pia. As nórdicas foram muito bem até as semifinais, chegando a derrotar a anfitriã China diante de mais de 55 mil pessoas, mas caíram diante das algozes norueguesas.
Na disputa pelo terceiro lugar, a Suécia não tomou conhecimento da Alemanha e goleou por 4 a 0, tendo Pia marcado uma vez. Sundhage finalizou a competição com quatro gols marcados.
Sobre a partida que garantiu o pódio, Sundhage disse ter uma memória “vívida” sobre o dia e recordou uma situação inusitada.
“Eu lembro daquele dia muito bem. A Alemanha era um ótimo time também. Nós estávamos sentadas no corredor e o secretário geral - algo como o presidente atualmente - falou com a gente. Não foi uma reunião, foi algo espontâneo. Eu lembro perfeitamente do lugar que eu estava sentada, como eu estava sentada, onde cada uma estava. Ele disse: ‘Existe uma grande diferença entre ganhar e perder esse jogo. Vocês voltaram para casa com a medalha ou voltam com nada.’ Nós queríamos dar o nosso melhor e vencer por 4 a 0 foi fantástico”, completou.
Pia era tão polivalente que nos últimos anos de carreira jogava como zagueira na seleção. Na Copa de 95, com ela nessa função, a Suécia foi eliminada nas oitavas de final para a China na disputa por pênaltis. Aqui, Pia bateu e converteu sua cobrança.
No mesmo ano, Pia ainda seria vice-campeã da Eurocopa feminina mais uma vez. Novamente jogando na casa das adversárias, as suecas perderam a final para a Alemanha por 3 a 2.
A última grande competição de Pia pela seleção foi em 1996, nas Olimpíadas. Esta foi a primeira vez que houve a modalidade nos Jogos, mas a Suécia não foi bem e não passou da fase de grupos.
Pia viveu diversos momentos com a camisa da seleção sueca. Foi centroavante, foi meio-campista, foi zagueira. Foi campeã, foi vice-campeã, foi terceiro lugar. A heroína no seu país encerrou a carreira pela seleção sendo a maior artilheira da história, com 71 gols em 146 partidas. Posteriormente, Sundhage foi ultrapassada por Hanna Ljungberg (72) e Lotta Schelin (88).