Hope Solo poderia ser unanimidade. Como goleira, foi incomparável na história do futebol feminino. Uma bandeira da modalidade. Mas sua postura firme mediante a injustiças e sua personalidade forte, capaz de declarações sem filtro em momentos de pressão, a afastaram da "família" do futebol. Hope foi uma loba solitária. Do início ao fim da carreira. Viveu diversas tempestades na vida profissional e pessoal. Errou. Mas independente de tudo, conquistou seu lugar no Hall da Fama como uma das principais personalidades do esporte estadunidense.
Tudo poderia ter sido diferente, porém, se Hope não tivesse aceitado os conselhos de suas treinadoras na Universidade. Natural de Richland, Washington, Solo sempre recebeu apoio da famíia na sua paixão pelo esporte, principalmente de seu pai, Jeffrey, um veterano da Guerra do Vietnã. Mas Hope não era goleira: era atacante, e das boas.
Na High School, foi um absoluto fenômeno, disputada, em seguida, pelas principais universidades do país. Escolheu a Universidade de Washington para ficar perto do pai, que havia recém-encontrado após anos de separação (Jeffrey chegou a ser preso acusado de sequestrar os filhos). Nessa época, o pai de Solo não tinha casa e contava com a ajuda da filha para se estabelecer. Mas nunca perdeu um jogo de Hope.
Confrontada se queria ser uma grande atacante ou uma goleira fora de série, Hope aceitou o desafio e se tornou uma das melhores goleiras do país já na Universidade. Ainda como jogadora universitária, foi convocada para um período preparatório com a seleção em 2000. Reclamou de um ambiente tóxico em um grupo fechado pelas campeãs mundiais de 1999.
Hope só foi convocada para as Olimpíadas de 2004. Não entrou em campo. Em 2007, jogou a primeira Copa do Mundo. Hope embarcou para a China após receber a notícia da morte do pai. Foi uma Copa emotiva para a goleira, que começou como titular, e passou três dos quatro primeiros jogos sem sofrer gols. Teve grande atuação nas quartas, vitória por 3 a 0 sobre a Inglaterra. Mas não jogou a semifinal.
O técnico Greg Ryan aceitou o pedido das jogadoras mais experientes do grupo para dar a vaga na semifinal, diante do Brasil, para a veterana Briana Scurry, que se despedia da seleção. Foi um desastre para as estadunidenses, e um dia inesquecível para nós, brasileiros. Vitória da seleção brasileira por 4 a 0, com um show da Rainha Marta. Não houve palavras para descrever. Só que palavras não faltaram para Hope na zona mista após o jogo.
"Foi a decisão errada (colocar Scurry). Acho que qualquer um que saiba qualquer coisa sobre o jogo sabe disso. Não tenho nenhuma dúvida que eu faria aquelas defesas. O que importa é que não é 2004 mais. É 2007 e acho que você tem de viver no presente, você não pode viver de passado, não pode viver de nome. Não importa o que alguém fez na final olímpica há três anos. O que importa é o presente", disse Solo.
Hope foi afastada da equipe e nem sequer voltou para os Estados Unidos com o grupo. No ano seguinte, entretanto, foi reintegrada por Pia Sundhage, que a considera a melhor goleira da história do esporte. Hope Solo enfim ganhou seu primeiro momento de glória: foi titular e protagonista do início ao fim da campanha do ouro dos Estados Unidos, com vitória na final diante do Brasil. Uma revanche de algo que Hope não viveu (pelo menos em campo).
Outra revanche olímpica aconteceria em 2012: os Estados Unidos venceram o Japão na final dos Jogos Olímpicos, um ano depois de perder a Copa do Mundo para as japonesas nos pênaltis.
Bicampeã olímpica, só foi ter seu final feliz em Mundiais em 2015. Estava no auge. Sofreu apenas um gol em toda a campanha até a final. O adversário era o Japão. Goleada por 5 a 2, e Hope era, também, campeã do mundo.
A despedida da seleção foi amarga. No Rio de Janeiro. Em jogo amarrado, os Estados Unidos acabaram eliminados nos pênaltis pela Suécia nas semifinais das Olimpíadas. Após o jogo, pela postura defensiva, Hope chamou as suecas, que eram dirigidas por Pia Sundhage, de "covardes". E acabou tendo o contrato rescindido com a US. Soccer. Sem jogo de despedida. Sem tratamento de lenda. Hope encerrou a carreira naquele mesmo ano, pelo Seattle Reign.
O rompimento com a U.S Soccer pode ser olhado por outra ótica. Hope sempre esteve na linha de frente da luta pela igualdade salarial entre homens e mulheres no futebol.
No mesmo ano de 2016, Hope havia convencido Carli Lloyd, Megan Rapinoe, Rebecca Sauerbrunn e Alex Morgan a apresentarem uma queixa à Comissão de Igualdade de Oportunidades de Emprego contra a U.S Soccer por discriminação salarial baseada no sexo.
"Eu não tive jogo de despedida, que toda jogadora veterana, na história dos Estados Unidos, teve. Eu joguei três Olimpíadas, três Copas, mais de 200 jogos pelo meu país... Dei minha vida ao jogo, ao país, ao esporte, para a federação...", disse Hope anos mais tarde no documentário Untold: Hope Solo x U.S Soccer, da Netflix, justamente sobre o litígio.
Em 2022, as jogadoras da seleção chegaram a um acordo de 22 milhões de dólares com a U.S Soccer e encerraram o caso, algo criticado por Hope Solo. Desde então, a principal batalha da ex-goleira foi pela igualdade salarial entre homens e mulheres.