Andrés Iniesta ficou imortalizado na história do futebol por seus gestos. Técnicos, humanos, humildes, únicos. O jogador que rodou os gramados de La Liga em 2010 sendo aplaudido por rivais. Quase como unanimidade. Não apenas pelo gol que o consagrou. Mas pela figura que é. Pelo craque que, quando resolveu pendurar as chuteiras, trouxe um enorme sentimento de nostalgia em quem o viu jogar. Para aqueles mortais que podem dizer: vi Don Andrés em campo. Vi a história ser escrita.
História das mais belas. História que mostra que a vida é bela. História de amor e inocência. Do menino de Fuentealbilla que foi descoberto em 1999 e se mudou para La Masia. Lá, se formou ao lado de uma geração única. Messi, Xavi, Piqué, Valdes, Fàbregas, Busquets... Muito talento junto. Mas até com tanto talento ao lado, Iniesta conseguiu ser singular.
O lance mais característico de Iniesta, consagrado ao longo da carreira, foi a chamada "croqueta", drible no qual trazia rapidamente de uma perna a outra, como um drible rápido de futsal. Habilidoso, genial, inteligente. Andrés Iniesta estreou no profissional do Barcelona sob o comando de Louis van Gaal, em 2002. Foi titular em jogo contra o Club Brugge, pela Champions. O gol da partida foi marcado por Juan Román Riquelme. O meio-campo tinha ainda Gabri, Fábio Rochemback, o brasileiro Geovanni fazia parte do time.
Na temporada seguinte, Iniesta começou a ganhar mais espaço, no início do Barça de Frank Rijkaard. Valdés já era o goleiro do time que ganhou o reforço de Ronaldinho Gaúcho. Mas foi só em 2006 que Andrés virou titular em um meio-campo que respeitava a hierarquia de Mark van Bommel, Edmílson e Deco. A versatilidade possibilitou que Iniesta ganhasse cada vez mais importância no time, oferecendo repertório tático a Rijkaard.
Aquela equipe, com protagonismo de Ronaldinho, conquistou a Liga dos Campeões em 2006, com vitória na decisão diante do Arsenal. O time foi ao intervalo perdendo, mas a entrada de Iniesta no intervalo, no lugar de Edmílson, ajudou na reação e na virada, por 2 a 1.
Iniesta participou da criação da jogada do primeiro gol, de Samuel Eto'o, e também no gol do título, que terminou no histórico chute de Belletti que valeu a "Orelhuda".
Na temporada seguinte, Iniesta ganhou a companhia de Xavi, que começou a ter mais protagonismo no time ainda com Rijkaard. Foi o início de um dos maiores meio-campos da história do futebol. Em 2008, Busquets se juntaria a ambos e, sob o comando de Pep Guardiola e com Messi cada vez mais protagonista, o Barça iniciou uma verdadeira revolução.
No tiki-taka de Guardiola, Iniesta passou a ser peça central. Sua técnica e visão de jogo privilegiadas ajudaram a potenciar uma equipe que tinha como tema central dominar seus adversários através da posse de bola. O trio com Xavi e Busquets foi um dos maiores da história do futebol, com uma sinergia fora de série.
A cereja do bolo foi o título da Liga dos Campeões em 2009, que não seria possível não fosse o gol de Iniesta, nos acréscimos em Stamford Bridge, contra o Chelsea, com assistência de Messi. Foi um dos momentos mais marcantes da carreira do meia. Na final, contra o United, um show, com direito a assistência para Iniesta.
Foi a segunda de quatro Liga dos Campeões de Iniesta. Mesmo depois da saída de Pep, o time manteve a boa fase e conquistou, ainda, nove vezes o Campeonato Espanhol e seis a Copa do Rei com o meia.
O momento icônico em meio ao drama
Pouca gente sabe, mas Andrés Iniesta quase abandonou a carreira no futebol precocemente. No verão de 2009, Dani Jarque, amigo pessoal de Iniesta e capitão do Espanyol, faleceu em um hotel em Florença, durante a pré-temporada da equipe, por uma parada cardíaca. A morte teve grande impacto no mundo do futebol, especialmente em Iniesta.
"Eu nunca senti que não queria continuar jogando. Sabia que teria que seguir em frente, era um processo, e como você supera aquilo. Procurei refúgio nos meus amigos e no futebol", contou, em entrevista ao The Guardian em 2016.
Um ano depois, Andrés Iniesta estava com a seleção espanhola na África do Sul. Se jogou pouco na Copa de 2006, o meia virou protagonista com Vicente del Bosque no título europeu de 2008, quando o técnico aplicou, à sua maneira, o tiki-taka.
O início da campanha na Copa de 2010 foi conturbado, com derrota na estreia para a Suíça. Iniesta não jogou contra Honduras, mas marcou o gol da vitória contra o Chile, que levou a equipe para o mata-mata.
Iniesta era mais que o amuleto da sorte do time que derrubou Portugal, Paraguai e Alemanha, sempre por 1 a 0. E na final, não foi diferente. O jogo contra a Holanda foi para a prorrogação. O barulho das vuvuzelas continuava ensurdecedor. Até que, faltando pouco para a decisão ser nos pênaltis, Fábregas ficou com sobra de bola na meia-lua e abriu na área com Iniesta. O meia ajeitou para a perna direita e bateu cruzado, superando Stekelenburg. Saiu para o abraço. Levantou a camisa da Fúria e, embaixo, veio outra com os dizeres: "Dani Jarque, sempre conosco". Com a camisa do amigo, Iniesta subiu ao olimpo do futebol, para jamais ser esquecido.
Don Andrés
Depois do gol do título mundial espanhol, Iniesta voltou ao Barcelona. Nos estádios que foi inicialmente, recebeu sempre ovações, quando era substituído. Se tornou herói na Espanha. Virou Don Andrés.
Ainda conquistaria outra Eurocopa pela Fúria, estaria no Brasil para a Copa de 2014 e daria adeus aos Mundiais, e à seleção, em 2018. No mesmo ano, se despediu do Barcelona. Sem o mesmo protagonismo, mas com a idolatria intacta. Antes da despedida no Camp Nou, goleada sobre o Sevilla na final da Copa do Rei. Don Andrés ergueu sua última taça em seguida.
Soberano, o Barcelona foi campeão espanhol com 14 pontos de frente para o Atlético de Madrid. No dia 20 de maio, o Camp Nou levantou para aplaudir Don Andrés. Eram 35 do segundo tempo, e Paco Alcácer entrou no lugar do meia. Busquets ainda estava ao seu lado, e aplaudiu. Como Piqué. Como até o time da Real Sociedad.
Iniesta ainda presenteou os japoneses com sua genialidade nos anos seguintes. Foi campeão japonês e da Copa do Imperador pelo Vissel Kobe, que formou equipes competitivas por lá. Até 2023, quando deixou a equipe, mas ainda buscaria um último passo.
Queria completar 1000 jogos como profissional. E se despediu do futebol no Emirates Club, dos Emirados Árabes. Foram 1016 jogos de Iniesta, com 107 gols. Um gol que ninguém jamais esquecerá. Mas que está longe de resumir a importância de Don Andrés para o futebol. Um artista singular.