A história parece se repetir com o passar dos anos: uma menina viu seus colegas do sexo oposto chutando uma bola e decidiu desafiar a regra socialmente já estabelecida de que só meninos jogam futebol. Um dia, essa menina se meteu no meio dos meninos e mostrou a eles que o esporte não tem sexo.
A história dela, Gabriela Nunes da Silva, ou Gabi, foi assim. Aos sete anos, começou no futsal e se misturou com os meninos na escolinha do Grêmio Ilsan, na Vila Albertina, em São Paulo. Mostrou aos meninos que o esporte é, também, coisa de menina. Até que um dia não pôde mais jogar.
"Acabei jogando os campeonatos importantes do futsal na minha categoria, até que um dia me proibiram de jogar com os meninos. Falavam que menina não podia jogar com meninos. Depois, fui pro Macabi. Lá, já tinha time feminino", conta, para a reportagem de oGol.
Gabi sempre foi precoce. Começou a jogar com os meninos aos sete anos, depois foi a mais jovem a jogar no Macabi e, mais tarde, acabou sendo artilheira do Campeonato Brasileiro com apenas 18 anos, pelo Centro Olímpico.
"Acabei indo pro Centro olímpico em 2012, onde eu comecei realmente a minha trajetória no futebol. Lá foi onde me formei como atleta. Graças a Deus, meus anos no Centro Olímpico foram incríveis. Conquistamos todos os campeonatos da base, conquistei títulos individuais e a ida pra seleção de base. Sou muito grata ao Centro Olímpico, a todos os técnicos e as meninas que já joguei junto, pois sem a formação que tive lá não seria a mesma que sou hoje", admite.
No Campeonato Brasileiro de 2015, a jovem Gabi fez 14 gols em 12 partidas, uma ótima média de 1,17 gol por jogo. Ali, mostrou ao Brasil que uma nova goleadora estava surgindo. E uma goleadora de todas as formas: boa com a bola nos pés, e na cabeça.
"Sempre treinei bastante para melhorar todas as formas técnicas, tanto no alto como no chão. Graças a todos os ensinamentos que tive, ao decorrer dos anos pude ter uma melhora e hoje sinto que estou um pouco mais completa. Mas claro que tenho que melhorar sempre", confessa, com consciência e humildade.
Gabi parece estar no futebol há tempos, mas o tempo vem sendo um bom amigo. Em poucos anos como profissional, a atacante já soma feitos impressionantes.
"Tudo aconteceu muito rápido. Tenho apenas quatro anos de profissional e já pude conquistar bastante coisa, como a Copa do Brasil, meu primeiro título como profissional, prêmios individuais e também a ida para a Copa do Mundo sub-20 e a ida pra seleção principal. Sempre tento lidar da melhor forma possível, sempre alegre e sempre com os pés no chão, pois sei que tem muito a melhorar", afirma.
Gabi faz parte dos planos da seleção brasileira para o futuro e já é o presente da equipe. A jogadora foi convocada pela técnica Emily Lima para o primeiro amistoso do ano, contra a Bolívia, em Manaus, no próximo dia 09.
"A seleção brasileira está trabalhando para voltar a ser a melhor seleção do mundo. Com o novo comando e com as informações que estão sendo implantadas, tem tudo para fazer um ótimo trabalho", analisa.
A atacante não se vê como herdeira de Marta e Cristiane, duas das principais jogadoras da história do país. Gabi quer levar, junto com as duas, a seleção ao caminho dos títulos.
"Marta e Cristiane têm muito a dar para a seleção ainda, quero ajudá-las a continuar sendo as melhores. Sempre é uma felicidade muito grande poder estar perto delas. Já pude jogar com a Cris no Centro Olímpico, no meu primeiro ano de profissional, e foi uma experiência incrível. Agora, poder jogar na seleção com a Cris, Marta e outras que admiro... Vou ficar muito feliz e realizada, pois desde pequena acompanho elas e hoje vou poder estar jogando junto", revela.
Gabi joga o seu terceiro Campeonato Brasileiro. Na atual edição, já marcou três gols em quatro partidas. A jogadora analisa a evolução da competição ao longo dos anos.
"Tive a oportunidade de jogar dois Brasileiros e esse ano está melhor que os outros anos. Vamos ter o dobro de jogos, tem duas divisões e, consequentemente, mais times podendo jogar, times de camisa. Acredito que está bem melhor e acredito também que todos os anos vai melhorar cada vez mais", opina.
Apesar das melhorias na competição, e de mais atletas poderem ter oportunidade de jogar, Gabi sabe que o futebol feminino no país tem muito a evoluir.
"Hoje, poucas meninas podem depender do futebol. A diferença de salários, se for comparar do futebol masculino e feminino, não se discute. Tem uma grande diferença, mas, graças a Deus, hoje posso ajudar minha família, que era uma coisa que eu sempre queria desde pequena. Pude abrir minha marca, GN, também com ajuda de pessoas confiáveis, minha família e com o direcionamento de Deus".
Hoje defendendo as cores do Corinthians, Gabi se diz feliz e satisfeita, mas não deixa de sonhar. Entre os sonhos estão o futebol europeu e o objetivo de ser a melhor jogadora do mundo. Se quando pequena, Gabi já pensava alto, não era agora que iria deixar de pensar...
"Sonho, sim, em jogar fora. Sei que indo para lá posso evoluir cada vez mais, porque sei que lá é bem diferente e difícil. Mas estou feliz esse ano aqui no Corinthians, trabalhando para podermos fazer um excelente ano", conta, sem parar de sonhar.
"Tenho muitos sonhos, mas o meu maior sonho é poder conquistar o prêmio de melhor do mundo. Sei que estou bem longe, mas é um sonho".
Enquanto sonha, Gabi vive a realidade. No último domingo, esteve em campo na vitória do Corinthians sobre o Sport, pelo Campeonato Brasileiro. O Timão está 100% na competição, com 15 pontos após cinco jogos e lidera o grupo A ao lado do Iranduba. Clique aqui e saiba tudo sobre a competição!