Deyverson era só mais um Silva no Rio de Janeiro. Vivia uma vida dura, mas não desistiu do seu sonho. Foi vendedor de rua para se sustentar, mas seguiu sonhando. Afinal, sonhar não custa nada. Até que a oportunidade bateu na porta, e Deyverson mostrou estrela cada vez que ela apareceu. Das ruas ao Camp Nou. O improvável se tornou real para quem nunca deixou de acreditar.
O sonho de Deyverson no início não era marcar gols, muito pelo contrário. Era evitar. Quando menino, treinou com seu pai (Carlos Roberto Silva) e irmão (Anderson Silva), um que foi goleiro e outro que ainda é, e queria seguir o mesmo caminho.
"Comecei a treinar com meu irmão e hoje em dia sei agarrar. Tinha o sonho de ser goleiro, mas meu pai falou que não, que essa profissão era muito injusta. Falou para eu ir fazer gol. Então comecei a treinar com meu pai na escolinha dele, foi onde eu aprendi a ser centroavante", lembrou, em conversa por telefone com a reportagem de oGol.
Descontraído, mas consciente. Com orgulho de onde veio, apesar das dificuldades. Foi assim que se mostrou Deyverson Silva ao falar da vida que tinha no Rio de Janeiro.
"Eu passei muitos momentos difíceis antes de estar aqui, no futebol europeu. Na escolinha do meu pai, passei por muitas dificuldades. Não só eu, mas vários jogadores. Não estou me fazendo de pobre coitado. Mas comecei na escolinha do meu pai, onde não tinha uma chuteira, condições financeiras para ter quadra para ir treinar, às vezes não tinha café da manhã...", confessa.
Nem sempre as portas se abriram para Silva. Passou por categorias inferiores de Tigres do Brasil, Artsul, Vasco... "Nunca dava certo". Teve, então, que tentar a sorte em outra coisa, apesar de sempre sonhar com o futebol.
"Comecei a trabalhar vendendo salgado com meu irmão. Ficava de bicicleta com meu irmão vendendo na rua. Depois fui trabalhar com o senhor Joel, ficava na barraca vendendo com ele", conta, sem vergonha alguma das origens humildes.
Até que um dia a oportunidade bateu na porta. Deyverson voltou a tentar jogar no Santa Cruz do Rio e, em um amistoso contra o Grêmio Mangaratibense, foi descoberto pela equipe de Mangaratiba.
"O meu ex-empresário levou um amigo dele para ver um jogo meu. Marquei dois gols, e ele me levou para fazer um teste de 15 dias no Benfica. No último dia de teste teve um amistoso. Faltando dez minutos para acabar, eu fiz 2 a 0. O treinador, Norton de Matos, me avaliou e eu assinei cinco anos de contrato".
Deyverson lembra, aos risos, a primeira experiência que teve em um avião. Foi exatamente quando foi fazer testes em Lisboa. Uma emoção única para quem andava nas ruas do Rio de bicicleta.
"Foi uma situação de medo e um momento de alegria, porque sei quantas crianças sonham em jogar um dia em um clube grande. Muita gente pergunta: ´Como é andar de avião´? É um sonho bastante gratificante para mim andar de avião e jogar em um time da Europa com grande dimensão".
Em Portugal, as chances nos Encarnados foram poucas. De Lisboa, levou mais para a vida os amigos. Lembra de Alan Kardec, Júlio César (hoje no Fluminense), Luizão, Sidnei, Elvis (ex-Botafogo), Copetti (ABC) e Bryan (Cruzeiro). Mas Deyverson, após fazer oito gols pela equipe B, foi defender o Belenenses. Foram mais 12 tentos até se mudar para a Alemanha.
"Para mim, foi o lugar mais difícil que eu pude jogar. Depois de uma ou duas semanas, eu fiz amizade com alguns brasileiros. Pude conhecer um pouco a cidade, aprender umas palavras em alemão, mas foi bastante difícil. Os alemães me trataram super bem. Sobre o Colônia, só tenho coisas boas a falar. Tenho saudade da cidade. Acho que o que me complicou foi a língua e um trauma na perna, que me deixou um mês parado. Isso me prejudicou um pouco".
O tempo de Alemanha foi curto, até ser contratado pelo Levante, da Espanha. A língua deixou de ser uma barreira. "Na Espanha é mais tranquilo. No começo foi um pouco complicado, mas morrer de fome eu não iria, porque pedir comida é só apontar, né?", brinca.
"Foi uma sensação maravilhosa. Quando era pequeno, ficava vendo eles jogando no Camp Nou. Imagine você jogar... Ter a oportunidade de jogar contra grandes jogadores, Messi, Neymar, Suárez... Foi uma sensação maravilhosa. Entrar no Camp Nou, filmar... Parecia até uma criança feliz. Quando a criança ganha um pirulito fica feliz. Parecia até eu entrando em campo. Parecia mais torcedor. Foi bastante emocionante", revela.
No primeiro jogo, derrota por 4 a 1. Deyverson defendia o Levante e entrou no segundo tempo. Mas, com a camisa do Alavés, a história foi outra.
O brasileiro jogou os 90 minutos do encontro, marcou um gol e ajudou sua equipe a conquistar uma histórica vitória sobre os Blaugrana, na Catalunha.
"Para mim, foi uma noite de bastante cansaço. Depois do jogo, só fiz deitar na cama e dormir, porque foi um esforço danado ganhar o Barcelona. Fazer gol ainda mais... Foi motivo de bastante alegria não só aqui, mas para minha família, que esteve aqui, para Santa Margarida, onde eu moro, para algumas pessoas que torcem pelo meu sucesso, tenho dois amigos que são malucos por mim, Daniel e Marlon... Foi motivo de alegria para todo mundo".
A estrela de Deyverson Silva brilhou. Não só em campo, mas na vida. O atleta segue sonhando, já que foi esse o combustível que o levou tão longe até o momento.
"Tem que crer. Que a gente pode passar pelas dificuldades. Se você tiver força, colocar na cabeça que é possível, você chega lá. Então, o que eu tenho para falar é: acredita nos seus sonhos, acredita que vai passar pelas dificuldades. Na vida, nada é fácil. Porque quando vem fácil, vai fácil. Quando é difícil, você dá valor. Foi isso que passou na cabeça quando fiz o gol (no Camp Nou). Só me arrepiava, imaginava tudo o que passei, quando não tinha uma chuteira, não tinha dinheiro para ir treinar, quando tinha que jantar pipoca com água, meu café sem açúcar, meu pão sem manteiga... Isso tudo passou na minha cabeça, as dificuldades que passei para chegar até aqui. Tenho que dar muito valor a isso".